Nossos impulsos | Monge Genshô

Nossos impulsos | Monge Genshô

Nós somos, em essência, ondas kármicas e essas ondas se manifestam continuamente. Quando fazemos a pergunta “quem se ilumina?” ou a pergunta “quem sofre as consequências de nossas ações?”, manifestamos uma incompreensão de nossa natureza, porque somos manifestações no universo, como ondas são manifestações na superfície do mar. Somos manifestações provocadas pelos ventos dos nossos impulsos.

Assim, a pergunta “quem?” não se coloca, porque uma onda não tem um “quem”, ela é só isto: uma manifestação na superfície do mar. Ela sequer faz mais do que se propagar no meio da água, assim como o som se propaga no meio do ar. Ela não viaja carregando água de um lado para o outro, mas apenas faz um movimento que se propaga. 

E quando perguntamos “quem sofre as consequências?”, devemos compreender: modificamos nossos impulsos e, assim, modificamos nosso karma. Ao modificarmos nosso karma, modificamos a manifestação dele como onda. E é o karma que manifesta identidades. Assim sendo, ao modificarmos o karma, modificamos todas as manifestações, as suas características e modificamos, portanto, a maneira como as identidades se manifestam.

Todo o tempo, nós não somos mais do que karma se manifestando. Essas manifestações dizem a si mesmas “eu sou”, assumem identidades. Então, é o karma que manifesta identidades, não são identidades que carregam karma.

É por isso que a pergunta “quem?” não se coloca, porque todos os “eus” não são mais do que construções necessárias, mas elas mesmas evanescentes, mutáveis, não permanentes, em contínua mudança. Essa mudança é uma excelente notícia para nós, porque, assim, temos possibilidades completas de modificação. Podemos mudar a nós mesmos, mudar a forma da nossa manifestação, mudar suas características, sermos seres completamente novos, crescermos e nos aperfeiçoarmos. Não estamos fixos nem presos a nada. 

Na verdade, compreendermos isso nos dá grande liberdade e enormes possibilidades. Todos os mundos de manifestação são possíveis para uma onda kármica, basta que ela se aperfeiçoe e mude, para, dessa existência, passar para uma existência de um nível muito superior.

Agora, nossa concentração deve ser sobre o sofrimento, porque esta é a mensagem de Buddha, de que o sofrimento pode ser erradicado, e a felicidade plena pode ser atingida. Manifestações superiores a isso foram referidas, mas não são o objeto da nossa prática budista agora. Primeiro praticamos os preceitos, as virtudes, e assim nosso karma será modificado, em consequência as manifestações que ele gera também são modificadas.

Compreendamos, então, que esses “eus” não são mais do que a sensação deste momento, desta vida, desta memória, e que, a cada vida, é como se tivéssemos um “eu” completamente diferente. Mas, na verdade, se prestarmos atenção, como nosso “eu” é propiciado pela nossa memória e pelas nossas ações, então ele não é sólido, ele é pura mudança. Por isso dizemos que todos os seres são vazios de “eus inerentes”, ou seja, um “eu” que seja sua verdadeira natureza, que seja permanente, que tenha uma alma ou um espírito, sempre o mesmo. Não é assim.

Felizmente, estamos livres dessa prisão e somos possibilidade e mudança todo o tempo.

Teishô Matinal proferido por Meihô Genshô Sensei, maio de 2021.