Mente de principiante - Parte 1 | Monge Kōmyō

Mente de principiante - Parte 1 | Monge Kōmyō

Shoshin é um termo que existe no Zen-budismo. Ele foi ensinado por Dōgen Zenji. Eihei Dōgen foi o monge e mestre Zen-budista que introduziu o ensinamento Zen no Japão. A minha escola foi fundada por ele, que é a escola Zen japonesa.

Shoshin é traduzido em Português como “mente de principiante”. É um conceito que se torna muito importante. Como o próprio nome diz, a “mente de principiante” é a atitude de alguns iniciantes no Zen – não todos -, mas algumas pessoas vêm procurar o Zen e elas possuem uma qualidade como se elas fossem um papel em branco. Elas não tem ideias preconcebidas, não têm nenhum conhecimento preconcebido.

Por tanto, Shoshin é uma atitude de pureza e abertura, e é uma atitude muito necessária no Zen. Embora o termo dê alusão ao principiante, àquela pessoa que inicia, de fato a atitude Shoshin precisa ocorrer até mesmo com os mestres. Ela se contrapõe à atitude arrogante, intelectualista, à atitude de alguém que se acha superior. Como ensina Suzuki Shunryū, um grande mestre Zen, “a mente de principiante é a mestre Zen”. Todos vocês aqui sabem como é difícil praticar o Zen. No inicio, a dificuldade é muito grande. Dói o corpo todo. Não há paciência. A gente fica esperando que toque o sino logo, não sabe o que fazer, nem sabe o que vai acontecer.

Quando eu iniciei o Zen, eu era muito jovem e sabia zero sobre o Zen. Por algum mérito misterioso, eu comecei o Zen sem esperar nada do Zen. Mas quando eu comecei, também tive as minhas ilusões. Embora eu não esperasse nada intelectualmente do Zen, tinha ilusões sobre a prática. Ilusões místicas, de levitações e poderes mentais.

Uma coisa é nós criarmos algumas expectativas; a outra coisa é nós pautarmos a nossa prática em cima dessas expectativas. Eu não demorei muito, na prática Zen, a ver derrubadas essas minhas ilusões sobre poderes místicos e todas essas tolices. E, por talvez algum mérito, esse lado meu de “mente de principiante” permitiu que eu iniciasse o Zen sem rotular o Zen disso ou daquilo.

Mas a “mente de principiante” é algo que não se manifesta necessariamente no inicio. Algumas pessoas as vezes vem no Zen e já tem leituras e ouviu falar, ou vem para o Zen com outros conhecimentos e interpretações. O fato é, que como Dōgen Zenji ensinava, a prática vai ser muito mais difícil quanto mais nós criarmos ilusões e expectativas no Zen.

Porque a prática nunca termina. E, depois de década praticando o Zen, eu comecei a perceber que a “mente de principiante” é a mente ideal para obter a experiência de aprendizagem, engrandecimento, equilíbrio, paz e sabedoria. Quanto mais uma pessoa tenta estudar – quanto mais ela tenta compreender o Zen com livros – mais difícil fica. Quanto mais uma pessoa cria essas expectativas que eu sempre falo e insiste em manter essas expectativas, mais o Zen se torna difícil.

[CONTINUA]


Palestra proferida por Kōmyō Sensei no Daissen Niterói em 31 de março de 2023.