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Praticante: Pode-se dizer que é o karma que anima, dá vida e consciência aos seres?
Sensei Genshō: Não podemos dizer exatamente isto, desta forma. Então vamos entrar no terreno da própria biologia. Nós podemos dizer que, porque existe karma, existe o vento que faz com que as ondas se agitem. Mas não vamos prosseguir até o ponto de dizer que o karma é a origem de todas as coisas porque vamos dar a ele uma identidade, uma realidade, como se ele fosse uma entidade em separado e ele não é. A palavra karma significa ação e significa que as ações produzem consequências. Trata-se disso.
Praticante: Sensei, por que estamos em um período de ouro?
Sensei Genshō: Nós estamos em um período de ouro porque vocês estavam sentados em Zazen, antes de ouvir a palestra. É por isso que é um período de ouro. O período seguinte na história do budismo, é sempre um período em que se começa a estudar e se abandona o Zazen. E acha-se que o ensinamento é tudo, que devemos discutir e debater, mas que a prática é muito cansativa, dolorida, etc. E aí surge a primeira grande decadência.
Depois, os ensinamentos parecem muito complicados, complexos e são deixados de lado e as pessoas começam a fazer só rituais, bençãos e cerimônias. Que no fundo tem algum toque supersticioso ou pensa-se que criam bons resultados, magicamente, para o mundo. Começou-se, por exemplo, no passado a acreditar que se houvesse um templo, então não haveria terremotos naquela região, ela seria protegida dos desastres e coisas assim. Isso é um pensamento mágico.
Enfim, O último período de decadência, é o período apenas em que a prática do Zazen foi abandonada, a prática do estudo foi abandonada e sobram apenas ritos e cerimônias. É o último período. Ritos e cerimônias vazias. É o último período de decadência e aí o Dharma é esquecido. É necessário que surja um novo Buddha para fazer com que o Dharma renasça.
Então, nós estamos num período dourado agora porque nós estamos numa região do mundo e temos organizações agora aqui que enfatizam todas as coisas. Temos as práticas da cerimônia, sim, mas elas não são tão importantes para nós quanto o estudo e à prática do Zazen. E por isso então, temos nossos Sesshins e nossa prática, e ela sim pode levar ao despertar, assim como o Buddha conseguiu. Por isso essa é uma época dourada.
Praticante: É apropriado dizer que a escola Sōtō-shū cresceu justamente para focar nos leigos? E seria apropriado dizer que essas escolas budistas que não meditam ou estudam o Dharma são apenas budistas nominais?
Sensei Genshō: Podemos dizer que a escola Sōtō-shū cresceu por estar focada no Zazen. E focar-se também nos leigos, já naquela época, era uma forma de ajudar as pessoas.
Conta-se uma história de que dois mestres da escola Rinzai, que estavam ligados ao imperador, passam numa carruagem, numa estrada, e veem os monges da Sōtō Zen trabalhando junto com os camponeses no campo, plantando arroz. E um diz para o outro: veja esses pobres monges aí trabalhando na lama e nós estamos aqui vestidos de dourado, com nossos mantos bordados e estamos indo para o palácio do imperador. E o outro diz: olhe bem pela janela, vão passar alguns séculos e eles estarão com o Dharma vivo e nós, teremos desaparecido, nosso poder terá se esvaído.
E foi exatamente o que aconteceu. Quando o império caiu, caiu a escola Rinzai. Mas na escola Soto estava disseminada na prática da meditação e ela poderia sobreviver. Isto naquele momento, porque hoje já não é bem assim, e em todo o Oriente, práticas como a do Zazen têm sido progressivamente abandonadas e é raro encontrar grupos fazendo Zazen.
Nós não enxergamos isso, mas nós, aqui, estamos em um outro momento. Aqueles que viajarem e praticarem em outros lugares vão perceber isso. Quanto ao que outras escolas budistas fazem, não fazemos considerações. Não diremos se eles são budistas nominais ou não, isso não importa. Eles representam um momento histórico, mas esses momentos mudam e basta aparecer um mestre dando um outro enfoque para que as coisas mudem. A história toda do budismo é uma história cíclica, em que há períodos dourados, há períodos de decadência, há períodos em que o Dharma praticamente parece que desapareceu. Até que aparece um mestre, como aconteceu com Dōgen, lá pelo ano 1230, a chegar no Japão, e dizer, não, eu vou ensinar o verdadeiro budismo.
Portanto, esse movimento é um movimento cíclico, um movimento que se repete. Como Śākyamuni Buddha disse: a vida é Dukkha, ou seja, a vida é cíclica, cheia de altos e baixos. E assim também acontece com o Dharma. Cabe a nós sermos cuidadosos e sinceros com a nossa prática e nos focarmos no despertar. Como ensinou meu mestre, que vejo como um grande reformador, Saikawa Rōshi.
Palestra proferida por Genshō Sensei em teishō na Daissen Virtual em agosto de 2024.