Pacifismo e militarismo

Pacifismo e militarismo

4) Uma vez vi em uma entrevista, um repórter perguntar ao Dalai Lama o por quê do Tibete, sendo um país tão pacífico, sofrer tanto nas mãos dos Chineses e o Dalai Lama respondeu que o Tibete tem carma para isso. Esse é um exemplo de carma coletivo?
Monge Genshô – Exatamente. Se você renascer no Tibete, é porque tem carma para isso. Com tudo o que o Tibete já foi, ele já teve um povo guerreiro e conquistador. Transformou-se em povo pacífico? Sim. Mas carma de povo pacifico é ser dominado por povos agressivos. Uma coisa interessante que acontece na história humana é que nenhuma cultura de fundo matriarcal sobreviveu, com exceção feita àquelas isoladas em ilhas. Porque as características dessas culturas é não serem guerreiras. As culturas guerreiras patriarcais destruíam as matriarcais. Isso aconteceu também na história Budista, como por exemplo, o Tibete.
O Budismo nunca sobreviveu aos confrontos armados. No século XIII os islâmicos invadiram a Índia e destruíram o Budismo, universidades muito mais antigas que as da Europa, como a Universidade Nalanda com 10 mil alunos que foram queimadas e os monges mortos. Na China, o budismo também foi destruído e no Tibete atual o budismo está em processo de destruição, tudo através da força. Como o budismo tem uma marca pacífica e tende a fazer com que seus povos sejam pacíficos e não militares, no confronto, é destruído.
As pessoas dizem que no Japão foi diferente e o Budismo sobreviveu. No Japão houve certa associação com o Shintoísmo e durante um período de paz foi possível esse crescimento. Foi no período “Tokugawa”, durante trezentos anos de isolamento. Quando o império japonês foi se militarizando e entrando em confrontos com o ocidente, na restauração “Meiji” em 1868, surgiu uma pressão para restaurar o Shintoísmo como religião nacional, porque ela fazia do imperador um Deus e permitia o militarismo. O budismo havia transformado os samurais, que eram guerreiros, em pessoas sensíveis capazes de escrever poesias, pintar e fazer arranjos de flores. O imperador, com o objetivo de enfraquecer o budismo, tratou de baixar éditos. Muitos destes éditos tiveram efeito positivo em seu objetivo de fazer renascer o Shintoísmo enfraquecendo o budismo, o resultado foi um Japão militarizado que se lançou em guerras, primeiro contra a Rússia, na década de trinta contra a China e depois a Segunda Guerra Mundial.
Bom, voltando à origem de nossa discussão, o pacifismo não sobrevive aos confrontos com o militarismo. Doutrinas como a Budista só sobrevivem em locais pacíficos, democráticos e com liberdade. É muito provável que o que está acontecendo agora em Bangladesh, onde os budistas são minorias e os templos estão sendo queimados é que o budismo vá desaparecer, talvez não totalmente, mas nesse confronto o lado pacifista, no caso o budismo, irá perder. Com certeza não leremos noticias de um grupo de budistas queimando templos muçulmanos, não existe um suporte doutrinário que torne os budistas guerreiros, melhor morrer que matar.
5) Dentro desse tema, melhor morrer que matar, não seria legítimo eu lutar pela minha vida?
Monge Genshô – Sim, é legítimo que você lute por sua vida. Mas carmicamente é melhor morrer. Nagarjuna, grande mestre do século I que pertence à nossa linhagem, foi assassinado. Ele foi esfaqueado e seus discípulos que o encontraram sangrando, perguntaram quem havia feito aquilo. Sua resposta foi – “eu mesmo”. Seus discípulos sabendo da impossibilidade de Nagarjuna ter cometido tal ato, perguntaram novamente. “Fui eu através de meu carma, se eu disser quem fez isso, vocês odiarão e irão querer vingança e esse carma não terá fim”. Ninguém jamais ficou sabendo quem matou Nagarjuna e também ninguém foi perseguido ou morto por causa disso.