O silêncio no retiro

O silêncio no retiro

Por isso, no zazen, as instruções, “não pense no passado”, “não pense no futuro”, “não viaje para suas memórias”, as memórias são fantasias, “não viaje para o futuro”, o futuro também é imaginação, só existe na nossa mente. Nossos sofrimentos só existem na nossa mente. Nós os criamos. No sesshin (retiro) escolhemos não conversar, não falar, porque quando falamos invariavelmente produzimos movimento no mundo, ondas de sentimento nos outros. Podem ser coisas boas, podemos fazer um elogio, produzir um sentimento caloroso, mas mesmo esse sentimento, no fundo, tem uma relação de afago ao ego, ao orgulho, à vaidade.
Dentro do sesshin não conversamos para evitar todos esses fenômenos do ego e poderemos perceber que os atritos são infinitamente menores do que se as conversas fossem permitidas. Se houvesse conversas se formariam grupos e com esses grupos com certeza desconforto. No sesshin tudo é ritualizado para que prestemos atenção e ficarmos mais presentes nesse mundo, nesse momento. A grande prática chama-se Grande Atenção, existe um Sutra, o Sutra Da Plena Atenção, que fala sobre as técnicas de praticar a atenção. Quando você caminha, sinta o chão sob seus pés. Quando sentado em meditação, ouça os sons, não se afaste, fique aqui e ouça o riacho sem parar, não deixe que o som desapareça, esteja atento. Seu olhar deve enxergar a maravilha do mundo, não vemos a maravilha do mundo pois estamos perdidos em nossos pensamentos. Mas a maravilha está presente em todos os instantes, nossa vida é extremamente preciosa, é única. Devemos vive-la como uma grande oportunidade, não sabemos exatamente quando e como ela vai terminar, mas irá terminar para cada um de nós, então esse momento é muito importante, no fundo fazemos sesshin para aprendermos a viver, para nos distanciarmos da embriaguez do mundo. Não devemos ouvir música no sesshin porque ela nos distancia desse momento, do aqui e agora. Existe o momento de ouvir musica, e nesse momento deveríamos realmente ouvir musica, mas agora optamos por não ouvir ou fazer música, para que possamos ouvir outras coisas que estão perdidas durante a maior parte do tempo.
Algumas pessoas ouvem música como forma de apagar sua própria mente e sua percepção, muito alto, não escutam mais nada. Música para embriagar. Estamos aqui para fazer justamente o oposto, longe de toda embriaguez, de tudo que obscurece, de tudo que apaga, para vermos um mundo nítido, tal como ele surge. Por isso, no retiro, evitamos falar, explicar, justificar, pois todas essas coisas são manifestações de nosso ego. Não pedimos desculpas, nem dizemos obrigado, nem bom dia, isso tudo é desnecessário. Se dizemos bom dia e a outra pessoa não nos responder, logo podemos ficar ofendidos, “mas por que ele não me respondeu?” a situação fica resolvida com o silêncio. Nada a dizer.