Pergunta: Dōgen fala “o ‘eu’ expondo-se em ordem”, o que significa isso?
Monge Genshō: Mesmo o “eu” é só tempo. Na verdade, tu estás sentado no banquinho agora, mas daqui a pouco não vai ter ninguém neste banco, tu só existes aí, sentado neste banco agora, neste momento. Então, você “ser” neste tempo, não é “ser” em outros tempos.
Não existe nenhum “ser” ou “estado de ser” que seja independe do tempo, todo o ser é tempo, por isso o título, Uji significa “Ser no Tempo”, em outra passagem deste texto ele diz: “todo o tempo está em um único ponto”. Neste ponto, todo o passado está contido e todo o futuro também está contido. Essa é uma percepção não linear do tempo, porque o que nós chamamos de tempo Newtoniano é um tempo em que há uma linha correndo do passado para o futuro, então você sempre pode olhar para o tempo passado, para o tempo futuro e tem uma linha correndo. As pessoas mesmo se imaginam dentro de uma linha, ou que corre na sua frente com o passado a esquerda e o futuro a direita por exemplo, essa é uma percepção comum aqui no ocidente. Há pessoas que se imaginam também deslocando-se no tempo, mas esta linha do deslocamento está dentro delas, elas andam junto e os eventos acontecem quando elas chegam.
Uma escola de psicologia diz que essa percepção em que o tempo passa por dentro da pessoa é mais comum na América do Sul, as pessoas chegam atrasadas nos eventos porque os eventos só vão acontecer quando elas chegarem. Na Europa, o mais comum é uma percepção do tempo como uma linha que se desloca entre passado e futuro e que está fora do indivíduo, então ele tem que estar lá para alcançar o evento e as pessoas são muito mais pontuais por causa dessa visão imaginária de sua colocação no tempo. Há muito assunto para explorar nesta questão.
Trecho de palestra proferida por Meihô Genshô Sensei, Florianópolis, 2019.