O poder da palavra | Monge Genshô

O poder da palavra | Monge Genshô

O poder da palavra através dos tempos tem sido desacreditado, mas uma frase ou algo dito a um povo pode mudar tudo.

Antes da época dos Descobrimentos, capitaneada por Portugal e Espanha, a China construiu enormes navios, muito maiores do que as caravelas, e um almirante (Zheng He) (1371 – 1433)  se propôs a explorar os mares do mundo e os outros países, levando seus navios pelo mar do sul da China até lugares muito distantes. A China se chamava, então, a si mesma, o Império do Centro. Como em algum momento alguém chamou a grande China Song, de o Império do Centro, um imperador, logo a seguir, achou que nada poderia ser encontrado entre os bárbaros e que não valia a pena aquele esforço de construir esquadras e grandes navios de transporte. Pensava-se que era melhor que a China ficasse concentrada em si mesma.

Outro imperador proibiu invenções, porque tudo o que era bom já tinha sido inventado, e uma coisa nova poderia ser uma desvantagem ao destruir o mundo tão perfeito como já estava. 

No início do século XX, um congressista americano propôs que se fechasse o departamento de patentes dos Estados Unidos, porque tudo já havia sido inventado e não havia mais nada para inventar. Se percorrermos a história da humanidade, os exemplos desse tipo são inúmeros. Ideias expressas em palavras mudam destinos de nações, mudam os acontecimentos, mudam a própria história, levando, de um lado para o outro, as nações e os destinos de milhões de pessoas.

A mera declaração de que a Alemanha precisava de espaço vital levou à invasão da Rússia, da Polônia, desencadeou a Segunda Guerra Mundial e matou milhões. O desprezo e a dúvida pela ciência levam às condutas irracionais e elas são sempre expressas em palavras. 

Buddha ressaltou que um dos caminhos para escaparmos do sofrimento era o entendimento correto, pensamento correto, fala correta, ações corretas. Correto, aqui, quer dizer ideal, a mais correta possível. A palavra original quer dizer, mais proximamente, “ideal”, do que correto. Por essa razão, nós devemos cuidar muito daquilo que dizemos, porque o que falamos tem enorme influência e pode mudar as vidas de muitas pessoas. 

Não vigiar as próprias palavras é como deixar que os acontecimentos andem sem rédeas, é como propiciar um comportamento selvagem e irracional, baseado no egoísmo em vez de na solidariedade. Pensamentos e palavras devem expressar compaixão e retidão. Por esta razão, quando não temos certeza do ideal, melhor cultivarmos o silêncio e a quietude. Porque nos sentamos em zazen, acima de tudo, para termos clareza e lucidez sobre nossa mente e assim levar o mundo na direção do ideal e não da individualidade. 

Às vezes, perguntam-me como devemos cuidar da nossa autoestima. E digo que, na verdade, de autoestima o mundo não está falto: o mundo está falto de sentimentos de compassividade, de consideração pelos outros. É a expressão desse amor que é a manifestação da lucidez encontrada no zazen.

Teishô Matinal proferido por Meihô Genshô Sensei, abril de 2021.