Demolir o pequeno EU

Demolir o pequeno EU

Voltemos ao nosso tema do eu. Como é que nós treinamos para fazer com que o nosso eu enfraqueça. Como é isso? Primeiro nós sentamos em zazen. Por que sentar em zazen funciona para diminuir a noção de um eu? Porque se você senta e não cogita nem julga você é capaz de olhar, cheirar, degustar, tatear, sem colocar um eu nessas coisas, nem colocar um eu que está apreciando essas coisas. Todo o treinamento do Zen está focado em demolir o eu, é por isso que muitas vezes as pessoas não gostam do treinamento do Zen e se irritam com os professores do Zen, porque leram livros sobre o Zen Budismo e quando vêm conhecer um centro do Dharma, um monge verdadeiro ou um sesshin, em vez de eles terem oportunidade para se manifestar, para mostrar o seu eu, eles são todo o tempo instados a calar a boca, a fazer tudo junto com os outros, a não corrigir os outros, a não criticar, a não elogiar, a não fazer nada que está ligado ao eu.

São estratégias para diminuir o eu. A primeira estratégia é sentar em zazen e então ouça o pássaro cantar lá fora, mas não pense “um pássaro cantou lá fora”. Não coloque um eu no pássaro. Não há uma identidade no pássaro. Também não há uma identidade que ouve o pássaro. Não diga para si mesmo: eu estou ouvindo um pássaro, como é bonito o canto do pássaro. Todos esses são julgamentos. Nós temos que sentar no zazen, ouvir o canto do pássaro sem colocar nenhuma identidade no pássaro e nenhuma identidade no observador, que somos nós, do pássaro.

O som do canto tem que nos atravessar. Passar por nós de um lado ao outro. Não deixar rastro. Surgir e desaparecer. Estamos conscientes profundamente do canto. Ouvimos com nitidez o canto, mas ele passa por nós de um lado a outro. Nós não agarramos , não julgamos , não nos colocamos nele. Não pensamos o que aconteceu antes do canto ou o que vai acontecer  depois. Não esperamos o próximo canto. Não cogitamos do canto que já passou.

Ficamos sentados em zazen deixando que o canto dos pássaros aconteça naquele momento, não no passado nem no futuro. Não diga, agora o pássaro cantou, porque agora já é passado. Simplesmente sente e cante com o pássaro. Você é o próprio canto do pássaro. Você é o pássaro. Não é o pássaro que canta. Todo o universo canta. Você canta junto com todos os seres. Não há lá nem aqui. Não há passado. Não há futuro. Há só (estala os dedos) e pronto! Essa é a maior prática.

Se você atingir essa prática não precisa nenhuma outra porque todos os seus sentidos deixaram de funcionar para enganá-lo, para criar a consciência de um eu, você desarmou a armadilha que surge com as percepções e com a instalação da consciência.

(trecho do livro: O Pico da Montanha é onde estão os meus pés)