Budismo e Religião (2): Abandonar o Barco

Budismo e Religião (2): Abandonar o Barco

Pergunta: A espiritualidade profunda, esta última de concepção e meditação, não está ausente nas outras religiões, porque podemos verificar em freiras religiosas, que se concentram nessa unidade com a divindade e que obtêm o mesmo esclarecimento da concentração e da meditação, não é?

Monge Genshô: Vamos dizer assim, corrigindo um pouco: outros caminhos espirituais conduzem a realizações espirituais. O fato de em alguns deles haver uma prisão em algum aspecto, faz com que o caminho espiritual vá até um certo ponto. Por exemplo, se você pratica um caminho espiritual virtuoso, com uma porção de práticas espirituais, você cresce espiritualmente. Mas se você faz isso para obter algo, você sempre fica preso à identidade, não é? “Eu vou para um lugar assim! Eu vou!”. Você fica preso a uma identidade. Você não se liberta disso. Nesses casos, o caminho espiritual vai bastante longe, mas não há uma libertação completa, porque há um materialismo implícito: “EU fiz”. 

Houve uma Santa que tinha um caderninho que anotava suas boas ações todos os dias, uma espécie de contabilidade do que eu estou fazendo de certo, de bom: “eu vou cobrar isso. Eu vou cobrar a minha contabilidade”. O budismo diria: não, isso é materialismo espiritual. Você está negociando alguma coisa. A única maneira de você conseguir se libertar disso é você conseguir se libertar de toda essa amarra. 

É por isso que há um dito budista  que  diz assim: o budismo é um método, como uma jangada para atravessar um rio. Se você atravessar o rio e chegar na outra margem, você não vai sair carregando a jangada nas costas, não é? O budismo tem uma porta de saída para ele, porque ele também não quer ser aprisionador. Então, também como método de prática, é claro que você pratica, pratica, pratica e parece que nunca tem fim, não tem fim. Mas está dito que se você chega ao fim, você não precisa do budismo. Se chegar na outra margem, você precisa abandonar o barco (o método), senão você não sai andando: fica preso lá na jangada. Essa é a analogia relatada por Buda.

No entanto é preciso não ser pretensioso, há pessoas que tem um vislumbre e se acham plenamente iluminadas e pulam do barco no meio do rio e se afogam…