A Sangha - Parte 1 | Monge Kōmyō

A Sangha - Parte 1 | Monge Kōmyō

No fim de semana passado nós tivemos, o primeiro desse ano, o Zazenkai. Agradeço a todos que tiveram interesse em vir praticar com Anshin-san. Fico muito feliz que a sangha de Niterói esteja, não crescendo necessariamente em números, mas amadurecendo. Eu vejo, agora, que mesmo sem mim, há grandes chances da sangha continuar. Isso é bom. Claro que isso não aconteceria, simplesmente, por minha causa, mas pela presença das pessoas, pelo esforço e generosidade de Lúcia-san, de oferecer esse horário e essa sala, sem a qual não haveria qualquer condições, e os méritos de Anshin-san.
Eu, mais ou menos dez anos depois de iniciar minha prática Zazen, eu tinha meus 25, 27 anos, foi mais pro final dos anos 80 do século passado, eu cheguei a um impasse. Para os que aqui viveram os anos 80, sabem que era um período em que a comunicação e a informação não era tão eficaz, não tão rápida como hoje. Não havia celular, não havia internet. Não havia revolução da informação ainda. E eu era um praticante, que durante 3 anos, pratiquei com um monge, mas depois fiquei órfão. E praticava da maneira que eu podia, como um simpatizante, como vocês. Confiando nos livros mais qualificados que eu poderia conseguir. E no final dos anos 80, eu, muito mais por uma necessidade de praticar junto, considerando que eu não tinha um sangha para praticar, decidi promover uma. Foi uma ousadia de minha parte, considerando minha não qualificação para fazer isso. E ao longo daquela época, até hoje, eu me esforcei muito, passei muitas vezes esses horários de prática esperando as pessoas, e ninguém aparecia. E aí eu praticava sozinho.
Comecei praticando na casa de um amigo, e ele praticava às vezes comigo, e com o tempo eu fui encontrando pessoas generosas. Acho que com a energia do esforço. Então iniciei algumas tentativas de prática em pequenos lugares. Quase todas as vezes não funcionava. Na época eu era um arrogante prolixo que tinha a estúpida ideia de que eu sabia ensinar o Dharma. Mas eu sempre pratiquei, e com os meus erros, as minhas idiotices, aos poucos eu fui encontrando, primeiro o Thich Nhat Hanh, pratiquei durante muitos anos na sangha que havia dele no Rio de Janeiro, no centro Lótus. Assumi o meu primeiro nome de Dharma na tradição do Thai, e um tempo depois eu entrei no Zen. Tudo isso foi Zen, mas eu entrei formalmente na tradição Zen, isso já no início do século 21, 2000, 2001, por aí. Um pouco antes.
E aos poucos eu fui percebendo que construir a sangha não depende do professor, e eu compreendi porque, na tradição do extremo oriente, a constituição de um sangha é ao contrário do que nós fazemos aqui. Lá são os alunos que se reúnem, se esforçam, criam as condições para ir convidar o guru, o professor, para ensinar. No Brasil, não dá para fazer assim, não é o modo de se fazer, mas, aos poucos, de maneira muito natural, foi assim que foi acontecendo. As pessoas começaram a querer voltar, a querer praticar, não só durante alguns meses, mas durante anos e anos a fio. Finalmente, após mais aventuras de minha parte, a Lúcia-san ofereceu esse local. E eu trouxe a prática da clínica do Fernando para aqui.
E foi aqui, nesse local, em que essa semente finalmente começou a amadurecer. Já antes de vir para cá eu já tive minha primeira dádiva, eu encontrei o Paulo Titonelli, o Chikō-san. Nele eu percebi alguém com grande sensibilidade e grande capacidade, e ele me ajudou demais. E foi ele, durante a pandemia e a doença da minha filha, que conseguiu sustentar, da melhor maneira possível, essa sangha. À ele eu devo muto. Eu imaginei que a minha dádiva com o Chikō-san era tudo que eu poderia obter, mas aí veio o Anshin-san e o Aishi-san do Rio de Janeiro. Duas pessoas de sensibilidade, de grande capacidade na prática, e que tem me ajudado bastante. Porque construir grupo de prática é isso, nós ajudamos uns aos outros. E a minha função é a menor, é simplesmente ficar aqui e tentar ensinar a vocês, passar a vocês as estupidezes que eu cometi, e os acertos. E mostrar a vocês como fazer melhor.

(CONTINUA)


Teishō proferido por Kōmyō Sensei em 3 de março de 2023 na sangha de Niterói.